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segunda-feira, 2 de março de 2009

NÃO MAIS POILÃO DE BRÁ

Este post poderia começar de forma talvez mais interessante se dissesse que acordei com o som de uma explosão seguida do som de muitos tiros. Mas eu não acordei. E por isso acordei tranquila como em qualquer outro dia.
Infelizmente muitos guineenses em Bissau acordaram ao som da explosão e dos tiros.
Que conhecem muito bem, e que não os matando de vez, cada tiro faz morrer neles mais um bocadinho de esperança.

Ontem, ainda antes de dormir já sabia que tinham assassinado o Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas, “Tagma”. Mas inconscientemente – inconsciência tem sido o meu estado durante as últimas horas – não pensei que se pudesse seguir o que seguiu na madrugada.

De manhã eufórica, a tentar acompanhar as notícias na televisão, na net, a falar ao telefone, a devolver as chamadas não atendidas de madrugada, o meu estado não me permitiu logo compreender a situação. Pelo menos não de uma forma subjectiva.

Era triste e grave que o Presidente eleito democraticamente tivesse sido assassinado. Seria substituído pelo Presidente da Assembleia Nacional Popular. Alguns dias de instabilidade, de luto nacional. O país recuava um pouco, novamente. Mas daqui a uns tempos a normalidade.

(Tanto que hoje o Secretário Geral da CPLP já pediu para ninguém considerar que estes acontecimentos são normais na Guiné, apesar de já se terem repetido semelhantes).

Quase a meio da manhã não achei que a Nené viesse. Era normal que com todo o alvoroço não fosse um dia normal. Não iria haver aulas. Não iria à Faculdade. Talvez nem à rua porque o desaconselhavam os serviços diplomáticos.
Mas a meio da manhã a Nené chegou. Fui dar com ela na cozinha. Perguntei-lhe como estava, porque tinha vindo.
Foi a olhar para ela e a ouvir as explicações dela que “acordei” do estado de ignorância ou inconsciência em que estava até então. Veio carregar o telemóvel. Depois com olhos de quem tinha estado a chorar e com voz de assustada contou: “Não dormi. Toda a noite muitos tiros. (…) Os meninos ficaram em casa. (…) Sim, vou voltar para casa depois de carregar o telemóvel, vou ficar com os meninos. (…) Ninguém dormiu nada. Todas as pessoas estão muito assustadas. Algumas pessoas já começaram a fugir.”
A fugir? Então atingiu-me. As pessoas estavam com medo.
Ainda na 5ª feira passada, à tarde, ouvi guineenses louvar e chamar com alegria pelo Presidente Nino / General Cabi que passava na Avenida 14 de Novembro ao regressar ao país após duas semanas de ausência, e por isso muitos guineenses choram a sua morte e estão muito tristes, mas mais do que isso esta madrugada o povo guineense assustou-se, reviveu os momentos de terror da guerra que acabou há menos de 10 anos.
Não sei se com convicção suficiente disse à Nené que ficasse calma, que não iria haver mais guerra. Não ia acontecer mais nada.
Na foto, o Poilão de Brá, marco da “guerra do 7 de Junho”. A Junta Militar estava antes do Poilão de Brá (no sentido do aeroporto) e as forças leais do também então Presidente Nino Vieira estavam depois do Poilão (no sentido do centro da cidade).

Os guineenses não querem mais marcos de guerra, não querem mais guerra.
Ao fim de todos estes anos parece que a estabilidade de que se fala e deseja todos os anos está sempre a ser adiada para um futuro incerto. Hoje foi adiada por mais algum tempo.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

A MELHOR FOTO DO CARNAVAL

MIDJOR POSTAL DI N`TRUDO

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

CARNAVAL II – FOTOS E VENCEDORES

Mais umas fotos do Carnaval na Guiné-Bissau.

E já foram anunciados os vencedores do desfile do Carnaval da Guiné-Bissau em 2009:
1º Netos do Bandim
2º Bubaque
3º Biombo

Confesso que no desfile nem sempre consegui distinguir todos os grupos concorrentes mas os de Bubaque impressionam pela utilização das peças de arte Bijagó, que preparam todos os anos para as suas cerimónias e para esta festa.
Nas fotos do post anterior pertencem a Bubaque a terceira e a quarta.

A segunda foto do post anterior que retrata o "fanado", uma tradição balanta, pertence aos Netos do Bandim. Segundo o júri a decisão de atribuir o primeiro prémio aos Netos do Bandim (que foram também os vencedores do ano passado e de outros anos) deveu-se a facto de terem representado melhor a cultura de várias etnias da Guiné, através de diversas danças.

Mais sobre os netos do Bandim
aqui e aqui.

(Ao centro a Rainha Okinka Pampa, Rainha dos Bijagós)














terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

DAR VIDA SEM MORRER

Quinta-feira, dia 26, 21 horas, na RTP (1, Internacional e África).
Uma reportagem que recomendo.
Fica para depois da reportagem a história de uma visita à maternidade.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

CARNAVAL I

Ontem foi Carnaval, hoje é Carnaval e amanhã será Carnaval.
Serão estes os 3 dias de que sempre ouvi falar no provérbio “A vida são dois dias e o Carnaval são três”?
Não na Guiné. Por aqui o Carnaval começou na 6ª e não se vê dia de acabar. As barraquinhas do Carnaval já estão montadas há semanas e não se prevê que desapareçam antes de Maio (fotos para depois).

Para já fotos - a uma distância segura - do desfile de hoje na Avenida Amílcar Cabral, mas com promessas de mais e melhores.


terça-feira, 20 de janeiro de 2009

AMÍLCAR CABRAL

O Pai da Nação
Muito melhor do que poderia dizer aqui, dito ali:

Hoje é Feriado na Guiné-Bissau, pelo pior motivo de todos. Há 36 anos, Amílcar Cabral, a maior esperança de sempre do povo guineense, era assassinado.

domingo, 18 de janeiro de 2009

BIJAGÓS III

SOBRE BOLAMA ... E AS CANOAS
Não era associado a tanta tragédia que gostaria de voltar a falar nos Bijagós. Mas esta semana que agora acabou foi de profunda tristeza e luto para o país.
É assim a maior parte dos transportes entre o continente e as ilhas dos Bijagós, canoas rudimentares, com um motor simples, que tantas vezes avaria, sem qualquer segurança, sem coletes salva-vidas, sem rádio, sem GPS, nem sequer um simples foguete de sinalização.
Mais de 80 mortos entre o passado Domingo e Quarta-feira em quatro naufrágios, o mais grave no Domingo entre a ilha de Pecixe e o Biombo, outro no Rio Corubal, perto de Xitole e por fim duas canoas em
Varela.

Até hoje foram quatro as minhas viagens até aos Bijagós. As duas primeiras, contadas aqui, foram excelentes experiências. As duas últimas tiveram um final feliz mas até ao baixar da cortina houve algum susto e dor, em especial a última, que fica para depois.

Esta terceira história sobre viagens aos Bijagós teve lugar em Setembro de 2005. Mais de duas horas à espera do transporte que nos levaria de Bissau a almoçar em Bolama, e regressar nessa mesma tarde a Bissau já seria suficiente para achar que o plano para um Sábado tão agradável dificilmente seria cumprido.

Acabámos por sair de Bissau ao final da manhã nesta canoa, de seu nome Bragança, (de ar, ora aventureiro, ora duvidoso), e o motor que, mesmo para quem não percebe nada do assunto, tinha um “trabalhar esquisito” revelou logo passados alguns minutos a sua fragilidade para a missão em causa. Alguma manutenção pelos marinheiros a bordo (manutenção e marinheiros são eufemismos), sem mais do que uma chave que parece servir para mudar o pneu de uma bicicleta e o motor voltou a ganhar força para mais uma hora de viagem, não fosse o único senão o facto de precisarmos dele por mais outra hora ainda. E assim, se ouviu, aquele “poc, poc, poc” de quem dá os últimos suspiros de vida.

Ficámos literalmente à deriva no meio do mar. Para evitar sei lá o quê, largou-se a âncora e ali ficámos. Sem motor, sem rádio, sem coletes salva-vidas, sem nada. Reacção quase automática: vamos telefonar para que alguém nos venha buscar. E rede?

Houve quem se entretivesse a fazer uma vela com uns plásticos que havia a bordo, e quem tivesse tentado remar com uma pá de construção. São estes resultados inúteis que se obtém de experiências movidas por meia dose de esperança e meia dose de desespero.

Um milagre aconteceu, e mesmo os mais ateus a bordo nesse dia, não sabem explicar de outra forma o que aconteceu em cerca de dois minutos, os únicos em que um ponto de rede chegou ao telemóvel da Cláudia. No tempo em que as lutas entre operadoras de telemóveis estavam ao rubro não era possível ligar de um telemóvel da Guinetel para outro da Areba (agora MTN) e vice-versa, e como a Areba tinha acabado de chegar ao país ainda poucas pessoas tinham o cartão dessa rede. Só um contacto da Areba era possível, o Dr. Fodé. Em menos de dois minutos foi possível ligar ao Dr. Fodé, explicar mais ou menos o que se estava passar e em seguida a chamada caiu. Não voltámos a ter rede, da Guinetel nunca, da Areba só aquele bocadinho.
Não fazíamos ideia do seguimento que poderia ter tido aquela comunicação, foi tudo tão à pressa.

Cansados de esperar, ao sol, à chuva que entretanto caiu, e novamente ao sol, e avistando margem de um lado e de outro – Bolama à direita e a margem do continente à esquerda (que é como quem diz mato de um lado e mato do outro) - alguma coisa tinha que ser feita.

Sempre mais aventureiro, o João atirou-se à água, e não fosse ter-se mantido agarrado à corda da âncora nunca mais teríamos visto o João. Resultado, puxámo-lo para cima, a rir-se à gargalhada e achar que não era nada perigoso.

Bom, perceber-se a força da corrente, levou alguém a achar que o melhor era levantar a âncora porque quase de certeza que seríamos arrastados até à margem de Bolama. Ainda que fora do centro ou longe do porto (não fazíamos ideia) sempre seria a ilha.

Como a âncora não subia (não consigo explicar mais de metade das situações daquele dia) resolveram cortar a corda. E assim ficámos à deriva no meio do mar numa canoa sem motor nem âncora.

O destino arrasou com todas as previsões “científicas” de quem achava que íamos ser arrastados até Bolama, e fomos parar à outra margem. Primeira tentativa de sair da canoa e enterrávamo-nos até aos joelhos numa lama.

Foi nesse bocadinho de terra lamacenta que o Jorge conseguiu "A foto da viagem" (que depois até serviu a alguma publicidade para redes móveis). Deslizando em movimentos semelhantes a quem faz sky o João de telemóvel na mão e de braço esticado no ar procurava rede no telemóvel, naquilo que parecia ser mesmo o fim do Mundo. Ainda hoje não sei onde estávamos. E nunca conseguimos rede.

De volta à espera na canoa, quase no lusco-fusco apareceu uma canoa. Alguns sinais, movimentos, gritos, avistaram-nos, estávamos salvos. Ou não. Tudo bem explicadinho e um pedido de que nos rebocassem até ao porto de Bolama: Não era possível.

Parece inacreditável mas estávamos a meio caminho de ser salvos por uma canoa que não nos podia valer porque transportava madeira ilegal. Bom, não nos podiam levar ao porto de Bolama mas podiam-nos levar até à margem de Bolama e já estaríamos mais perto.

Rebocados lado a lado lá fomos e ali cada vez mais perto do destino da viagem tivemos direito ao mais belo Pôr-do-Sol do farol de Bolama.


Ao anoitecer chegaram mesmo os meios dos nossos salvadores. Ficámos a saber que o Dr. Fodé foi imediatamente ter com o Dr. Silva Pereira, que de imediato tratou de tudo para que alguém nos encontrasse e nos fosse buscar. Ainda hoje devemos continuar a dever agradecimentos a ambos mas nunca saldaremos essa dívida.

Aí estava então, a lancha que nos rebocou até Bolama.

É impossível resumir mais esta história, de cada vez que a conto é assim, extensa.

Aqui ficam as fotos de Bolama do dia seguinte, um dia fabuloso.

A casa onde ficámos a dormir. Há 40 anos atrás deveria parecer um pequeno palácio. Agora tinha portas e janelas partidas, buracos nas paredes, tinta lascada. Dividi o quarto com a Mónica. Duas camas que pareciam do quartel da tropa de há décadas. Colchão velho, sem roupa de cama. Começámos a conversar mas adormeci e dormi profundamente.
Com excepção da foto deste edifício, reabilitado por um projecto de pesca (de uma ONG?), as fotos seguintes são dos restos de edifícios coloniais.
O Palácio do Governador. Onde entrámos para ver os anunciados frescos no tecto e paredes e saímos pouco depois a correr cheios de pulgas nas pernas, aos pulos e a sacudirmo-nos. Risota total. Lá dentro passeiam-se diversos animais, cães, porcos e galinhas. (Sim, uma imundice. A lamentar.)
Uma piscina abandonada, de água verde-acastanhada.
Vestígios de jardins, outrora arranjados.
E restos, muitos restos, de tudo.
Antes do almejado almoço em Bolama, um passeio de barco, não na canoa Bragança, que a esta hora estava praticamente toda afundada no porto de Bolama, mas na lancha que nos salvou, para uns banhos na Praia de Ofir, antes muito requisitada, hoje quase sem areia. Fez valer quase tudo.

Finalmente almoçámos em Bolama e regressámos a Bissau só com 1 dia de atraso em relação ao plano, e com uma grande aventura para contar. Hoje, eu, a Mónica, o João, a Cláudia e o Jorge, o Dr. Ataíde e o Tio Daniel conseguimos contar a história e falar desta aventura a rir. Na altura apanhámos um susto, embora não demasiado grande porque não nos sentimos em grande perigo. Daí que todos tenham repetido a dose nos Bijagós, alguns com mais e maiores sustos, e é por isso que haverá um Bijagós IV.



Bolama, a ficar ao longe. Últimas imagens até uma próxima visita aos Bijagós.

(Agradecimentos das fotos ao João e ao Jorge)