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domingo, 24 de fevereiro de 2008

BAFATÁ DESERTA

Foi há quase 2 anos que fui a Bafatá. Bafatá é uma pequena cidade no Leste da Guiné-Bissau. Juro que não parece grande apesar de dizerem que é talvez a segunda maior cidade do país, a seguir a Bissau (agora Gabu também já cresceu e talvez tenha ultrapassado Bafatá). Talvez a cidade me tenha parecido mais pequena por se encontrar praticamente deserta. O centro da cidade é pouco mais do que estas fotos, tiradas a meio de uma manhã de um dia de semana (acho que 4ª feira) e onde, mesmo ao pé do mercado municipal não se vê quase ninguém.
A “grandeza” da cidade deve-se com certeza à grande floresta de um dos lados da cidade, que começa numa das margens do rio Geba e parece que não acaba, e ainda ao facto de ser a cidade natal de Amílcar Cabral.
Sensações contraditórias quando visitei Bafatá: uma cidade muito tranquila, mas que parecia ter sido abandonada à pressa, como se se fugisse de algo, e o que já foi e o que é - uma avenida principal, larga, agora esburacada, inclinada em direcção ao cais e ao rio, ao fundo, sereno, a degradação das casas de estilo colonial, outrora belas e oponentes, hoje, algumas ruínas, quase todas abandonadas.
Entretanto descobri que há uns “filhos da terra” com vontade de recuperar a cidade histórica, e
AQUI há mais fotos.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

AINDA VARELA

O último post já ia longo mas cinco dias em Varela tinham ainda mais que se lhe dissesse. Não podia deixar de contar 3 histórias.
A viagem a Varela há um ano quase não era possível. Em Agosto de 2006, época de chuvas, um camião demasiado carregado atravessou uma das débeis pontes que se atravessam no caminho para Varela, sobre estreitos cursos de água. A ponte não aguentou a carga e ponte e camião foram parar à água. Só há este acesso por terra para Varela e por isso a vila ficou isolada durante vários meses - dificuldades de todo o tipo, falta de tudo. Só no final do ano, esforços conjuntos de alguns particulares que lá tinham casas – movidos também por uma imensa vontade de lá irem passar o natal e fim de ano -, e alguns apoios exteriores (de entre os quais a Cooperação Portuguesa e a ONG AD) levantaram a ponte da foto. Eu sei que parece pequena mas a sua missão é grandiosa. E lá ao lado ainda se vê uma parte do camião afundado.

Na praia de Varela, para além de tudo o quanto é bom na praia, ainda mais nesta, quase deserta, houve um dia particularmente encantado pela presença de tantas gentes. Primeiro, homens e rapazes lançaram uma rede à água e, mesmo ali na praia, a pescaria foi abundante. Dali saíram as refeições de várias famílias que por ali habitam.

Depois apareceram muitas crianças. Tinham algo de diferente de outras crianças que se aproximam de nós, um pouco por todos os locais onde passamos na Guiné. Estas pareciam mais desconfiadas, distantes, ensombradas. Tiveram por ali um bocado e soubemos então que são crianças refugiadas que se separaram das famílias no conflito de Casamansa. Tão pequeninos e tão tristes.

domingo, 17 de fevereiro de 2008

VARELA

O ano passado o Carnaval foi um pouco mais tarde. Dos 4 Carnavais que já lá vão desde que vim para a Guiné, 3 foram passados fora de Bissau, ou mesmo fora da Guiné. É verdade que o Carnaval de Bissau tem alguma fama (mais um post para o futuro) mas é uma festa que me diz pouco, as confusões de gente ainda me dizem menos, e é sempre bom aproveitar uns diazinhos para ir conhecer outras paragens. É por isso que há precisamente 1 ano fugi para Varela.
Varela é uma localidade no Norte litoral da Guiné-Bissau. E que, ao contrário do litoral de Bissau, ainda tem praia. É certo que para chegar a essa praia a pouco menos de 200 Km de Bissau foram 7 horas penosas, mas no fim valeu a pena. Explicando as 7 horas para não afugentar todos os eventuais turistas, 3 dessas horas foram para passar a jangada de S. Vicente (fins-de-semana prolongados têm esse efeito na jangada, com a quantidade de gente que quer ir passear) e mais 2 dessas horas foram as necessárias para fazer os 50 Km que distanciam S. Domingos de Varela por um caminho inexplicável (ouve-se dizer que a estrada vai ser arranjada).
Só há um lugar para ficar em Varela: na Fá. A Fá é uma mulher amorosa e pela qual a idade não passa, tem uma daquelas juventudes eternas, raras no ser humano. Por lá o prato principal é sempre precedido de uma entrada de massa, ou não fosse o seu marido um italiano especialista na cozinha.
Foi difícil escolher algumas das fotos de Varela para vos mostrar. O resultado lógico das máquinas digitais são mais de duas centenas de fotos de 5 dias, mas a dificuldade de escolha não reside tanto na quantidade mas na diversidade.
*A praia mais afastada da vila, indo de jipe pela savana para Noroeste, é magnífica, uma imensidão de praia praticamente deserta, atravessada aqui e ali por pequenos cursos de água que se vêm juntar ao mar.
*A praia mais perto da vila revela um dos maiores problemas que assolam as costas por todo o planeta, ali é demasiado evidente que o mar rouba à costa todos os anos alguns metros. Há umas construções à beira mar, cujas obras pararam com o início da guerra, e que ao fim destes anos a beira-mar se tornou demasiado próxima, tendo já as ondas destruído parte delas.

*A sudoeste da vila há mais uma praia com pouca areia; qualquer dia estender uma toalha só na alta vegetação do mato.

Como mais alguns locais da Guiné, Varela é selvagem, tudo ali é natureza; de acção humana muito pouco:
*Construção pouca.
*Luz só alguma, pouca, de gerador e só para as primeiras horas da noite (com o gasóleo a 50 Km / 2 horas de S. Domingos).
*Água… só fria.
*Trânsito? Há mais cobras que meios de transporte.
*Estradas?!? :-)
Pela paisagem, pela paz, sossego, pela Fá – vale a pena ir a Varela.
Há quem já lá vá com muita frequência, e depois da ponte de S. Vicente (a estrada S. Domingos – Varela também dava jeito) vai ser um destino concorrido. Vão ver. Para descobrir antes dessa enchente.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

OS OLHOS AZUIS DA MEIDA, E A FATINHA

É raro mas, sim, os olhos da Meida são mesmo azuis. Também fiquei impressionada a primeira vez que vi esta menina tão negra, com os olhos tão azuis.
Comecei por conhecer a Fatinha no primeiro ano na Guiné, e um dia puxada pela mão dos seus 2 aninhos fui encontrar os outros meninos que ali viviam; afinal ao lado da estrada principal (e aqui tão perto), disfarçadas por uma ou outra casa melhores à frente, por esteiras, carros velhos e contentores, existem muitas “casas”.
A Fatinha era órfã de uma mãe que morreu, e de um pai que para ela nunca tinha vivido. O sonho da sua velha, fraca e pobre avó era que alguém desse um melhor futuro à menina. A Fatinha era a menina que se destacava entre todos os outros meninos daquela tabanca, a pele um pouco mais clara, umas expressões mais fininhas, a única com um vestido limpo, que contrastava com os meninos e meninas nus, ou só com umas cuecas ou só com uma t-shirt, roupa velha, rota, suja, com terra pelo corpo todo.
O destino da Fatinha sempre me pareceu diferente e mais sorridente do que o de todas as outras crianças. Assim foi, passado pouco tempo a Fatinha foi adoptada por um simpático casal italiano. Há duas semanas a avó e o Papa (tio) da Fatinha mostraram-me as fotografias vindas de longe, que muito me emocionaram. Hoje a Fatinha está crescida, com cerca de 5 anos, vive numa casa bonita, apaga as velas de um bolo de aniversário numa bela sala, e brinca na neve num lindo e quente fatinho próprio para a neve. Foi assim a sorte da Fatinha.
A Meida é uma ternura de menina. Também ela está crescida, passaram quase 3 anos desde aquela foto. Mas a Meida continua a viver na tabanca aqui tão perto. Sempre que a vou ver anda quase despida, descalça, cheia da terra onde passa o dia a brincar. É uma menina feliz, que não diz uma palavra de português, que reconhece a amiga nas fotos mas não compreende nada de todas aquelas coisas diferentes que rodeiam a amiguinha. Sempre que vejo a Meida, e os outros meninos lembro com saudades a Fatinha. Imagino se algum dia se irão reencontrar? Como será? Será que a Fatinha se lembra que tinha uma amiga Meida, negra de olhos azuis?

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

A JANGADA DE S. VICENTE

Umas horas após a 14ª passagem na jangada de S. Vicente a vontade de ver a ponte finalizada está mais atenuada do que naqueles momentos em que se efectua (primeiro se espera e desespera) uma das travessias do rio Cacheu. Mas é uma vontade que não desaparece. Nos últimos meses a travessia tem sido facilitada por um barco que ao lado da já cansada jangada a vai rebocando. Agora a travessia só demora 10 minutos. O tempo de espera para conseguir lugar é que varia, e muito. Mas desta vez a sorte não permitiu que chegasse às duas horas de espera. (Outras vezes passou das três horas).
A ponte começou a ser construída no ano passado, apesar de pensada e desejada há muito. A evolução da obra pode ir sendo acompanhada no Caderno de África.
Com a ponte terminada, Bissau estará a pouco menos de duas horas de caminho do Senegal, facilitando a deslocação das pessoas e o transporte de mercadorias; a duas horas de Ziguinchor, com um aeroporto, e a três horas de Capítulo Skiring, também com aeroporto e umas das melhores zonas balneares da região.
Que a ponte chegue depressa!