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sábado, 21 de agosto de 2010

A MI NA BAI FÉRIA

Para quem ainda aqui passa de vez em quando à procura de novidades sei que parece que fui de férias há muito tempo. Mas vim de férias há pouco tempo. As últimas férias da Guiné.
Regressei a Portugal há alguns dias. E confesso que nesta altura a vontade de partir se adensa.

Como quase sempre, a chuva começou a meio de Maio; este ano a primeira chuva caiu em Bissau na madrugada do dia 16. Nunca, em quase seis anos, choveu tanto desde a primeira chuva até ao dia em que, entre meados e fim de Julho, partia para férias como neste ano.

A chuva na Guiné tem um prenúncio especial. Por vezes o céu até já está cinzento há algumas horas, mas não basta. A anteceder uma chuvada está o vento, que se levanta de forma rápida e violenta. Em poucos instantes, o céu escurece um pouco mais e parece que tudo vai voar pelos ares. Partículas de terra levantam-se no ar, junto com algum lixo mais leve espalhado pelas ruas, papéis, sacos de plástico. Em poucos minutos a chuva cai, intensa, ora inofensiva, ora fatal.

Para quem tem um refúgio imediato ou transporte aqueles momentos iniciais são um espectáculo a que muitas vezes se assiste fascinado. Há algo de inebriante naquele rebuliço espontâneo e breve.

Mas depois da chuva começar a cair com força é como se só um abrigo nos salvasse.
Estava na rua do Mercado Central quando estava prestes a começar o primeiro jogo de Portugal no Mundial. O céu já tinha escurecido um pouco e a chuva adivinhava-se para breve. Regateava a compra de envelopes grandes para arquivo dos exames da faculdade (os recursos são limitados e, além disso, regatear, por ali, é praticamente obrigatório), de repente o vento soprou forte, o ar encheu-se de pequenas areias, a compra apressou-se e corri para a carrinha. Antes do refúgio ainda provei umas gotas de chuva e em seguida ela caiu com uma tal fúria que quase todas as pessoas que se encontravam na rua corriam a abrigar-se.

À medida que viajava, do Centro em direcção ao Bairro da Ajuda, ia fotografando as ruas a encherem-se de água… em muitas ruas, em poucos minutos a água sobe com tal rapidez que há pessoas a fugirem com água pelos joelhos.

Desalentam-me os buracos gigantes à beira das estradas, correntes que ganham força, verdadeiras armadilhas capazes de arrastar pessoas.
Encorajam-me os rapazes que, apesar do temporal, jogam à bola, alguns descalços. Na impossibilidade de frequentarem um lugar onde pudessem assistir ao jogo do Mundial estes rapazes homenageavam desta forma o seu desporto favorito.
São assim as memórias dos meses de Junho e Julho em Bissau. Uma mistura de emoções, um certo fascínio e depois o cansaço e a desilusão ao pensar em tudo o que se torna mais difícil nesta época, a deterioração dos telhados, casas, estradas, mosquitos a pairar em poças de água, cólera.

Em Setembro aguarda-me mais um mês de chuva mas por agora há que aproveitar a época seca e quente deste cantinho e esperar que as genti di Guiné (em especial os de quem já sinto saudades) aguentem da melhor forma o chuvoso mês de Agosto.

sábado, 12 de setembro de 2009

ONDE ESTAVA COM A CABEÇA?

Não sei o que me deu para sair de casa hoje. Esteve a chover horas seguidas sem parar. Era óbvio que as estradas estariam assim. Ou não andasse eu a ver este filme há quase 5 anos.

(Avenida que vai da Praça dos Heróis Nacionais para a Mãe d`Água)

(Rua do Bonjour no centro da cidade)

Bom, tinha prometido a um amigo que ia com ele ver uma compra importante que ele quer fazer, que prometo contar se se concretizar, e ao final da manhã, quando parecia que o tempo ia melhorar um bocadinho, lá fomos. Não foi nada boa ideia e ao fim de umas voltas pela cidade, com o tempo sempre a piorar, acabámos por adiar a pesquisa no mercado para um dia mais seco.

(Lado oposto da Rua do Bonjour que vai dar às NU)

Na estrada do Caracol, paralela à Avenida, num só sentido Mãe D`Água – Chapa, a hesitação perante um lago de lama. Bom, a toca-toca passou, o jipe também passa. Entra na poça gigante quase até meio mas volta a sair. Tenho mesmo que ir para casa e ter juízo.

A chegar ao Bairro está o Saliu ao portão, debaixo de chuva, chinelos de enfiar no dedo em cima da lama:
- Queria muito vir fazer visita para a Dr.ª! Ainda não tinha vindo desde que Dr.ª voltou.
- Obrigada Saliu! Não era preciso. Muito menos num dia como este.
- Não tem mal. Maimuna emprestou esta sombrinha
(traz um chapéu-de-chuva grande, preto, com duas varetas partidas). Não tem dinheiro para comprar uma sombrinha assim.
- Quanto custa uma sombrinha assim?
- 2.500.


Estaciono e está a Maria à entrada do prédio encolhida e a tremer.
- Maria, estás com frio?
- Sim.
- Está de chuva mas não está frio.
(Muda e a tremer aponta para a cabeça)
- Ah, estás doente?
- Sim.
Subimos.
- Queres Ben-uron ou Aspegic?
- Sim.
Típico.
- Junta um bocadinho de água, mexe e bebe. Toma um agora, outro só logo à noite. As melhoras.
- Sim.

Passados uns minutos a campainha. O Saliu com uma sobrinha nova.
- Dr,ª homem queria 3.000 por causa de chuva mas só paga 2.500.
- Boa Saliu. Até 2ª.

Passado mais um bocado a campainha outra vez. O Cabi. Ah pois, tínhamos um trabalho para fazer. Listas de convites, envelopes, etc.
- As pastas?
- Não pude trazer Dr.ª, tá muita chuva.
- A pen com as listas?
- Dr.ª não trouxe pen
(ri-se). Deixei em casa. Está a chover muito, sempre desde de manhã.
- A pen no bolso não se molha, não?
- Dr.ª de manhã cheguei todo molhado à Faculdade para ir abrir a Biblioteca. Tinha roupa num saco e mudei lá depois de chegar.
- Esquece. Não digas mais nada. Trabalhamos segunda-feira.

A meio da tarde estou na secretária, a escrever no computador, cortinados todos abertos, olho pela janela e está o
André a fazer sinais lá fora à espera que o veja. Pelo menos tem sombrinha. Fechada. Já só caem umas pingas. Vou à varanda.
- André que andas aqui a fazer?
- Um passeio.
(Dentro do bairro?, que é privado. Sim, pois.)
- Devias estar em casa.
(Silêncio)
- Ana, fizeram outra vez.
(Espero)
- Comeram e não deram-me de comer.
- Sobe.

Mas porque é que não está tudo em casa num dia como este?!?!?, penso.
As últimas revelações do André, contadas nesta semana do regresso, estão a dar que pensar desde ontem. Talvez para partilhar mais tarde porque tem que ser tudo visto com muita cautela. Todas as outras histórias são mais comuns. São normais estes episódios na época das chuvas: pessoas que não vão trabalhar porque nem conseguem passar num local com tanta lama, pessoas encharcadas até aos ossos, pessoas que não têm mais roupa seca para vestir, pessoas que adoecem mais do que em outras épocas do ano, vendedores de rua que se mantém à chuva porque é assim, carros que avariam dentro de grandes lagos enlameados, de profundidade às vezes desconhecida.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

MAIS UM REGRESSO A BISSAU

- Ali é Bissau!
- Ali? Mas está nevoeiro?
- Não. É mesmo assim. Não há luz!
- Não há luz eléctrica em Bissau?!?!
- Quer dizer há um sistema de energia da rede pública alimentado por geradores, mas a maior parte do tempo não existe dinheiro para o combustível ou manutenção pelo que quase nunca há luz nas ruas.
O ar atónito do passageiro europeu, ao meu lado no avião, não passa nem quando o seu anfitrião, guineense que não vem à sua terra há mais de uma década, o tenta confortar dizendo que a casa da sua família (onde pelos visto irão ficar) tem luz.
Apetece-me dizer-lhe que se devia ter informado melhor antes de vir, literalmente, às escuras, fazer prospecção de mercado para investir no país, mas fico-me por um sincero “boa sorte”.

À saída do avião a temperatura é a melhor do mundo, quentinho como eu gosto, e o já familiar cheiro a terra molhada denuncia que tem chovido, ou não fosse a época dela.

As pessoas que me vão buscar ao aeroporto têm variado ao longo dos anos; há uma que não muda. Desta vez pedi ao Braima para ir ao aeroporto e levar-me o jipe. Mas assim que saio da porta do aeroporto vê-se o
André a ultrapassar toda a gente e é o primeiro a agarrar-me a mala. Não falha. O Braima espantado com a rapidez daquele e sem estar à espera fica a olhar para mim, como que à espera, e acabo por lhe entregar a mala do portátil porque no seu olhar parece que se não levar qualquer coisa nem parece que foi ele quem me veio buscar.

A caminho do jipe, no estacionamento, aparece o Revilino, e o Cabi estava na carrinha à espera, não me tivesse eu esquecido de ligar a pedir para alguém me vir buscar. Não era necessário, obrigada na mesma, e amanhã lá estaríamos na
FDB.

Pego no meu jipe, dos pouco bens materiais que me dão alguma satisfação, e volto a conduzir na escuridão de Bissau, em direcção a casa.

Antes há que deixar o Braima em casa dele e para tal, no mesmo cruzamento onde habitualmente viro para casa, viro no sentido oposto, à esquerda no cruzamento do Bairro da Ajuda, sempre em frente irá dar ao Bairro de Missira. O arrependimento a poucos metros depois de virar para ali: não há alcatrão, só terra, lombas, buracos, poças de água e lama, e a única luz é a dos faróis do jipe. Devia ter ido à volta pela “Chapa”. Continuo entre a 1ª e a 2ª velocidade procurando passar no bocado menos mau de caminho.

(Cruzamento do Bairro da Ajuda)

Dá para aproveitar uma pequena "visita guiada", sabia que era ali para aqueles lados e pergunto a Braima:
- Onde morava o
Baciro Dabó?
- 2ª à esquerda.
- Ao passar ao lado, espreito, e lá está, uma vivenda alta e iluminada a contrastar com tudo o que está à volta.

Continuo no escuro. De repente o barulho de um pequeno gerador e eis que no meio da tabanca surge uma casinha cheia de luz, portas e janelas abertas. Alfaiates vários, em grande azáfama até no alpendre, máquinas de costura, panos e linhas. Fantástico.

- Estão a trabalhar às 3:30H da manhã? – pergunto a Braima que responde naturalmente: - Tem que ser, estão a fazer vestidos para o Ramadão.

Sorrio. Não pude tirar uma foto mas aquela imagem está gravada e esquecer-me-ei dela muito depois de fotos que efectivamente tirei.

Deixo o Braima, que está agora no djundjun (jejum) à porta da sua casa e sigo para a minha, desta vez pelo caminho da “Chapa”, bem melhor.

A temperatura continua óptima na rua, não me cruzo com mais nenhum veículo. A sensação de que esta é uma aventura que não tem fim, que é assim há anos, e ainda poder ser surpreendida com pequenos mas grandes acontecimentos volta a estar presente e sinto-me bem por ter regressado.

(Estrada/caminho de lama em época de chuvas)

quarta-feira, 28 de maio de 2008

1ª GRANDE CHUVA

Quando se ouve alguém mais experiente ouve-se sempre: antigamente as chuvas iam de Abril a Novembro. Acho que as chuvas continuam a acabar no Dia dos Finados para (estranha e parece que propositadamente) lavar as campas. Mas nunca mais as chuvas começaram no mês das águas mil. No ano passado, a primeira grande chuva foi cerca de 19 de Julho, já depois desta ave ter migrado para o verão algarvio.
Este ano, diferente dos últimos quatro meses de Maio que já aqui passei, já choveu. Uns só chuviscos no dia 15, a primeira grande chuva na semana passada, dia 22, e agora, espera-se que chova amanhã. 5ª, 5ª e 5ª. É assim a chuva na Guiné, quase certa. Como começou a chover cedo, chove de semana a semana, depois passará a chover mais, e chegaremos à fase em que choverá todos os dias. Mesmo aí a chuva traz algumas certezas, sucede frequentemente que durante vários dias chove só de manhã, quase sempre à mesma hora, um dia muda e durante uns dias passa a chover à tarde ou à noite.
Deve haver uma explicação meteorológica para isto, mas da qual não faço ideia, e por isso me surpreende tanto, mas de uma forma tão mágica que me quer fazer ficar nessa ignorância sobre o tempo.
Com o aproximar do tempo das chuvas, chegam também as trovoadas. Primeiro as trovoadas secas, que este ano quase não tiveram lugar, mas que não seriam as mesmas, agora que se foi embora quem comigo partilhava um assento no passeio a olhar para o céu, a ver os relâmpagos, longe, sem mais nada, sem outra luz, sem som, ainda sem chuva.
A última trovoada foi na 5ª feira passada, e trouxe chuva, bastante. Na falta de imagens em condições da chuva que foi ao início da noite, mas já muito escuro, deixo-vos a imagem tirada na estrada que vai dar ao centro; eram cerca das 21 horas, não havia luz na rua, a não serem uns reflexos que se vêm ao longe e que pertencem à Embaixada de Angola, que fica nessa estrada, mas parece dia, toda essa luz é de um dos ditos relâmpagos.
Nenhuma foto consegue transmitir uma destas trovoadas. Mas são impressionantes.


Esta foto foi tirada quase imediatamente a seguir à anterior, apenas uns metros mais à frente. Sei que não se percebe quase nada, mas são as luzes do carro que vinha em sentido contrário, e de resto só muita chuva e muita escuridão. A luz normal das noites de Bissau.