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quinta-feira, 6 de agosto de 2009

A MEIDA QUE AFINAL É MAIRA E MUITOS PANOS

Preparar Setembro é a razão pela qual as últimas semanas em Bissau, antes de vir de férias no fim de Julho, são demasiado trabalhosas. Este ano preparar Setembro não significava apenas a época de admissão e a época de exames de recurso na FDB. Comprometemo-nos a inscrever a Meida na escola e as inscrições eram em Julho, as matrículas serão em Outubro. Era preciso actuar rapidamente sob pena de mais tarde não haver vaga.

A inscrição implicava a entrega da cópia de certidão de nascimento, fotografias tipo passe e o pagamento. É aqui que começa mais uma aventura guineense.

Afinal, a Meida embora crescidinha não tinha ainda sido registada. O único documento que tinha era um cartão de vacinas. A primeira ida aos Serviços de Identificação e Registo Civil do Bairro da Ajuda foi uma tentativa frustrada para registar a menina. Tinha pedido ao Eliseu para me acompanhar e o funcionário do registo, depois de eu dizer que queria registar aquela criança, olhou para os três e perguntou com ar desconfiado: Quem são os pais? Não me ri e disse apenas que não estavam. Era imperativo que eles fossem e por isso pedi à avó que os avisasse que viessem o mais rápido que pudessem para Bissau.

Nesse dia fomos apenas tirar as fotos tipo passe da Meida. Fiquei com a impressão que era a primeira vez que lhe tiravam fotos sem ser as minhas digitais, o que me fez anotar para revelar algumas fotos digitais que tenho dela para levar em Setembro.
Segunda tentativa nos serviços do registo civil, no dia seguinte, a meio da manhã. Mais uma missão abortada pois era tarde demais. Pagámos o impresso que o funcionário iria preencher mas tínhamos que voltar no dia seguinte às 8:00h da manhã.

À terceira é de vez, e desta vez também foi, mas não sem algumas peripécias. No boletim de vacinas, o único documento comprovativo da existência da menina até então, o seu nome escreve-se Maira, a sua mãe apesar de dizer que se chama Sábado e todos a conhecerem como tal, no único documento oficial que possui, a cédula pessoal (não tem BI) chama-se Rutte, o sobrenome de um dos avós estava escrito de forma diferente no documento oficial do pai e no boletim de vacinas dela. Ultrapassados todos os obstáculos ficou registada com o nome de Maira Mebum Sanhá, nascida a 28 de Julho de 2002, filha de Mebum Sanha e de Rutte Sanhá.

Voltei a Portugal para um período de férias e cheguei com a sensação de uma primeira fase de missão cumprida, e cheia de panos para a Lena, que estava muito feliz ontem com as novidades e os resultados obtidos. 157€ em pouco mais de um mês que darão para a inscrição e matrícula da Maira e para os cursos de informática da Menô e da Ondinha. Não tenho dúvidas que rapidamente conseguirá o suficiente para as propinas deste ano.
Modéstia à parte os novos panos vindos da Guiné-Bissau são ainda mais bonitos e o trabalho da Lena, embora não tivesse dúvidas, agora pude comprovar ao vivo que é fantástico e muito perfeitinho. É assim o meu novo porta-moedas Guiné-Bissau.

Obrigada Lena!

Parte da família da Maira (pai, mãe, Maira e a irmã mais nova, Rosária)

sábado, 25 de julho de 2009

SUMOS NATURAIS

Durante alguns dias, aqui em casa, a Nené organizou umas pausas-café que foram servidas na Faculdade.

Foram um sucesso, em especial pelos sumos naturais que foram servidos.

De tal maneira que agora a Associação de Estudantes, envolvida num projecto, em que serve refeições no âmbito de umas formações que decorrem na Faculdade, este mês e durante os próximos, compra os sumos à Nené.

Tudo começou assim:
A Nené comprou um cabaz de ingredientes naturais.
E muito açúcar.

O primeiro sumo implica uma preparação com algum tempo de antecedência. Tem esta cor linda e apetecível e é na verdade uma infusão.
Ferver a água, juntar o ONJO, deixar repousar um bocado (cerca de meia-hora), coar, juntar açucar, mexer e deixar arrefecer. Esta matéria-prima são as flores do bagitche, umas folhas que por aqui existem (nunca tinha visto antes). As folhas podem ser juntas à sopa, serem simplesmente cozidas ou fazer esparregado. Não gosto. Mas as flores, secam, ficam com esta cor maravilhosa, e resultam neste sumo. O meu favorito.

O segundo é o sumo de FOLI (também dito fole). É um fruto de uma árvore trepadeira borrachífera de frutos acidulados, explica o dicionário. Para obter o sumo é descascar, esmagar com açúcar e juntar água.
Também se come só o fruto. Tem este aspecto um bocadinho feio e tosco, quando se abre também não é propriamente uma tentação, no entanto o sabor é agradável e o sumo é muito gostoso.

O sumo de Kabasera ou Cabaceira é feito a partir do recheio das cabaças, que, por sua vez, se encontram penduradas no embondeiro (árvore de grande porte).
AQUI as cabaças.

Modo de preparação: amolecer com água alguns minutos, esmagar, regular a água, coar, juntar açúcar.
Não sou fã mas dizem que faz muito bem ao colestrol. Uma vez na Gâmbia bebi este sumo misturado com outro que não me recordo e lembro-me de ter gostado.

VELUDO: o nome é bonito, a cor sedutora, o toque suave. Infelizmente não consigo gostar do sumo. Fica sempre espesso, não pode ser de outra forma, e em repouso a água separa-se da polpa. O modo de preparação é semelhante ao do anterior: amolecer na água, mexer, regular a água, coar e juntar açúcar.
O fruto avermelhado encontra-se numa árvore de vagens negras e aveludadas, de seu nome veludo e que o dicionário define como medicinal.

Dizem que quem bebe o Sumo de Farroba se tiver paludismo este se vai revelar, o que é melhor para a pessoa poder ser tratada. Neste caso ao sumo deve ser acrescentado mel.
O mesmo modo de preparação dos últimos.
Este fruto amarelo forte provém de uma árvore muita alta, chamada pé-de-farroba.

A Nené prepara ainda um sumo misto, de cabaceira, veludo e farroba, que é aromatizado com sumo de lima. Muito apreciado pelo que percebi embora não tenha conquistado esta adepta.

Fresquinhos e todos com muito açúcar estes sumos fazem agora as delícias dos beneficiários dos momentos de pausas-café, lanches e refeições que têm lugar na Faculdade, tendo substituído, felizmente, os, até então favoritos (e cheios de conservantes), refrigerantes de lata: Coca-Cola, Fanta, Mazza e outros.

Como já há por aí uma marca de produtos da terra, com slogan promovido por uma ONG: Kil ki i di nos i tene balur.

domingo, 12 de julho de 2009

PANOS, FAZEDORES DE SONHOS

Para uma menina que até à idade adulta viveu num lar cheio de amor, que teve sempre tudo o que precisou, e quase sempre o que quis, o mundo parece ser bem mais fácil do que o que é na realidade.

Quando cheguei a África, aos 25 anos, durante algum tempo vivi iludida de que tudo ia melhorar aqui, que ia fazer a diferença. Parecia tão fácil ajudar alguém. E toda a gente precisava de ser ajudada. Não demora assim tanto tempo a perceber que não se vai mudar o mundo. A desilusão tem sido quase uma constante na Guiné.
De 2005 para 2006 alguma coisa pareceu mudar. Foi a ilusão do primeiro ano aliada a alguns melhoramentos, uma maior limpeza da cidade, maior frequência de luz da rede pública, um povo cheio de fé numas eleições e num novo Presidente eleito.
Os anos que se seguiram não foram fartos de alegrias e até culminarem, no final do último e neste em que nos encontramos, numa profunda instabilidade, insegurança, tristeza, descrença.

Ouvi várias vezes a minha mãe dizer que quem precisa, precisa sempre, quem dá não pode dar sempre. É a pessoa mais generosa que conheço e a minha tinha Alcina, sua irmã, também. De um modo geral é feitio de irmãos.

Por isso quando algumas pessoas que viam o blog me começaram a perguntar como podiam ajudar fiquei a pensar: ajudar como? Há várias campanhas de recolha de fundos e bens que são enviados para aqui, e aconselho sempre a participarem nessas.

Mas uma das vontades mais firmes de querer ajudar partiu da
Lena, e pensámos e falámos, e concluímos que era possível aliar a sua ajuda a um projecto muito interessante. A Lena cria peças lindíssimas que vende no Atelier ao meu gosto e combinámos que eu enviaria os panos mais apropriados que conseguisse no Bandim e ela criaria peças com esses panos e o dinheiro realizado com a venda dessas peças serviria para ajudar alguém aqui na Guiné. Assim começou esta semana a campanha Afric-Ana + Atelier ao Meu Gosto.

À Lena cabe um trabalho que nem imagino e que pode ser imenso mas que ela parece fazer com muito prazer, a mim coube-me também uma tarefa difícil mas ao mesmo tempo aprazível. Difícil é escolher os beneficiários da ajuda, não falta que precise, e ao mesmo tempo decidir a forma de ajudar.
Entregar dinheiro a alguém porque é pobre é, a meu ver, uma ajuda com pouco retorno. Não significa que aqui ou ali não se dê dinheiro a quem pede, é impossível resistir quando alguém nos diz “tenho fome”. Mas andar por aí a distribuir dinheiro que alguém me enviasse nunca foi questão que eu colocasse.

Sem prejuízo de a ajuda poder ser alargada a outros destinatários ou ser feita de outra formas, hoje cumpre-me divulgar os primeiros destinos das receitas obtidas e a obter.

Há uns dias apresentei-vos a Menô e a Ondinha. Um dos seus sonhos é fazer um curso de informática. Acabaram de concluir o 9º ano e estão agora de férias. Informei-me e o melhor sítio para fazer um curso de informática é o SITEC. Uma empresa que vende fornecimento de serviço de Internet e materiais informáticos e respectiva manutenção. Assim, a campanha irá pagar a inscrição e propina de cada uma num curso de iniciação à informática, onde aprenderão a trabalhar com programas básicos, mas, de certeza, as suas preferências irão recair na aprendizagem do acesso à Internet.

Esta solução é, a nosso ver, não só a concretização de um sonho destas beneficiárias mas uma forma de lhes dar uma mais-valia para um dia concorrerem a empregos. No final do curso de 2 meses receberão um certificado, e quem sabe para o ano não se conseguirá uma oportunidade para frequentarem um nível mais avançado.
(Cada nível de curso de 2 meses custa 35.000 FCFA ou 53,35€)

O outro destino que foi também já definido mantém esta linha de pensamento de dar formação e ajudar a construir um futuro de conhecimento.
A Meida foi a menina que escolhi para inscrever numa escola privada onde iremos pagar as suas propinas.
Porquê a Meida e não outra criança qualquer?
Pelos seus lindos olhos, em primeiro lugar. É um cliché que aqui fica bem. Mas também porque em Setembro entra para a 1ª classe.
Temos muitas dúvidas em relação a este caso. Comprometemo-nos este ano mas queremos tentar o mais que pudermos fazê-lo todos os anos seguintes de escola.

A escola escolhida fica do outro lado da estrada em relação à casa onde habita. Chama-se Escola Privada Professor Doutor Cavaco Silva. É considerada uma das melhores escolas privadas da cidade. Tem boas condições e as aulas funcionam com regularidade, desde a pré até à 11ª classe (última do currículo). Informaram-me que o actual Presidente português teve conhecimento desta escola e com o seu apoio será criada uma biblioteca no próximo ano lectivo. Refira-se que aqui a importância das escolas privadas é grande e crescente pois o ensino público sofre de deficiências profundas. Este ano lectivo, devido a meses de salários em atraso aos professores, foram menos de 2 meses de aulas em todo o período que vai de Outubro a Julho. Interrupções de greve, de feriados, de dias de luto, instabilidade. Tudo serve para não se ir à escola ensinar e aprender. Bem diferente nas escolas privadas.

Esta ajuda já foi combinada com a família da Meida na última visita. Cresceu desde a última foto,
AQUI. Como a família da Meida é muito pobre a ajuda à Meida inclui roupa para ir arranjadinha para a escola, onde estudam alguns meninos de famílias com mais posses, e os materiais escolares, livros, cadernos, canetas, lápis e outros.
(Entre inscrição e propinas serão pelo menos 82.000 FCFA ou 123,47€)

Para terminar, faltam-me palavras suficientes para agradecer a imensa bondade da Lena, sem a qual nada disto se concretizaria, e agradeço mais uma vez às pessoas que também têm ajudado de todas as formas, em especial à minha mãe e à minha tia Alcina e às pessoas que algumas vezes lhes entregaram roupas e brinquedos para eu trazer e oferecer.

Aqui está parte da matéria-prima que foi enviada e que serve para a confecção dos sonhos destas meninas!

segunda-feira, 6 de julho de 2009

MUSEU ETNOGRÁFICO II

Ainda da 1ª visita ao museu ficou por contar a secção seguinte.

Estas são peças em barro feitas em Calequisse (zona Norte da Guiné), pela D. Amélia, uma mulher de etnia manjaca. Fazer estas peças é uma profissão hereditária que passa de mãe para filha, e, conta-me a Eveline, existem peças da avó da D. Amélia no Museu Nacional de Etnologia, em Lisboa.



Esta peça não é muito diferente de umas bilhas em barro que existiam nas aldeias em Portugal há alguns anos atrás. Assim que vi deduzi que a ideia era a mesma. Serve para levar a água e ir bebendo ao longo do dia; água que ali se conserva mais fresca do que noutros recipientes. Chamam-lhe moringo.



Este pote em barro serve para a reserva de água em casa. É típico da etnia balanta mas também é feito ou comprado por outras etnias.

Já vi alguns à venda e já vi fazerem deles vasos de plantas. É a adaptação para quem não tem quem ter potes em casa cheios de água.



De entre as peças de barro esta é a mais interessante: nesta panela, especialmente reservada para certas categorias de pessoas, é colocada água e nas cerimónias fúnebres, da etnia manjaca, os cadáveres são lavados com a água dessa panela. No entanto só os cadáveres de régulos ou da família deste, dos djambacus (feiticeiros) e das pessoas que têm como função enterrar as outras, têm este privilégio; formam o conjunto de pessoas mais importantes da tabanca.

Na etnia papel esta panela faz ainda parte de outra cerimónia. Enche-se de água e a partir dela lavam-se os noivos após o ritual do casamento e antes de se deitarem.

Mais numa próxima visita!

quarta-feira, 1 de julho de 2009

KAMPUNI

É a palavra bijagó para rapariga.

Dá nome à primeira revista feminina da Guiné-Bissau. Este post é dedicado à kampuni Mónica, pois foi pela falta deste tipo de revistas que ela começou o
mini-saia. Sei que iría ficar feliz de assistir a este nascimento.

Esta é a número 0, saiu no final de Abril, mas foi anunciado o lançamento do número seguinte para o fim do mês de Junho e confirma-se, saiu. A ver se tenho tempo hoje para ir buscar a minha que está reservada.

É essencialmente vocacionada para as mulheres mas é também uma revista de Arte & Cultura, como se auto apelida.

Ao lê-la aprendi mais sobre mulheres de sucesso, africanas ou de origens africanas:
* Rosa da Cunha, a capa da Kamupuni e Miss Guiné –Bissau em Portugal;
* Francisca Pereira, guineense, ex-combatente de Liberdade da Pátria e actual Presidente da Rede Nacional da Luta Contra a Violência do Género e da Criança na Guiné-Bissau;
* Vânia Oliveira, essencialmente conhecida como cantora, mas é também actriz, bailarina e escritora;
* Michelle Obama, a actual Primeira-Dama dos EUA, uma mulher forte, elegante e cheia de carisma, agora no centro de muitas atenções;
* Odete Semedo, escritora guineense de quem já falei AQUI e que lançou um novo livro “No fundo do canto”;
* Djamina Batista, guineense, modelo profissional com grande fama no Brasil e jornalista (o exemplo vivo do sonho da
Ondinha);
* Dulce Neves, cantora, que chegou a fazer parte do grupo
Super Mama Djombo, e que há vários anos tem uma carreira sólida a solo.

A Kampuni aborda ainda temas muito interessantes que fazem parte da realidade guineense, como:
- A mutilação genital feminina;
- O casamento forçado;
- A condição da mulher guineense, o seu acesso à vida profissional, o trabalho no campo;
- A saúde materna e a taxa de mortalidade materna;
- A SIDA;
- O
Carnaval (sinónimo de grande festa e reportado AQUI)
- A Biodiversidade, inseparável de um artigo sobre os
Bijagós com o título “Uma pérola no Atlântico”

E claro, pelo meio, aqui e ali, dicas de beleza, como técnicas de maquilhagem, conselhos de moda e alguns de decoração.

Pode parecer só mais uma revista feminina mas estando aqui parece muito mais que isso: um sinal, um instrumento de luta e divulgação. Na verdade grande parte do que a Guiné precisa é de esclarecimento, de saber mais, de falar e divulgar o que tem de bom mas também os problemas sociais que ainda existem.

Ansiosa pela próxima!

quarta-feira, 24 de junho de 2009

MENÔ E ONDINHA, AS FILHAS DA NENÉ

A Ondinha foi a primeira dos 4 filhos da Nené a querer conhecer-me, há mais de quatro anos. O seu verdadeiro nome é Benamexare, é o nome que tem no BI, mas odeia-o (mesmo), e só o revela a muito custo. O nomi di tchon é Ondinha e a maior parte das pessoas só a conhece assim. A outra filha da Nené também tem um nome no BI e um nome da terra. Chamam-lhe Menô mas no registo é Eraclina. A Ondinha é quem aparece aqui em casa mais vezes e nunca as tinha visto juntas. Até este dia em que lhes pedi. Afinal nunca tinha calhado porque apesar de muito diferentes são muito amigas.
A Menô tem 21 anos, é mais tímida, a Ondinha tem 17 anos e é extrovertida, faladora.
Estudam as duas na 9ª classe, fruto de atrasos por diversas e más razões, a guerra, anos escolares sem efeito, um deficiente sistema de ensino público. Estão finalmente numa escola privada, dizem que o ano está a correr bem e que vão passar de classe. Está quase a acabar o ano lectivo. Depois da 11ª classe querem seguir para o ensino superior; a Menô sonha ser médica ou enfermeira e a Ondinha quer ser jornalista e modelo.

Os cursos vão ter que esperar e sabem que aqui será difícil essa formação, mas a Ondinha já vai dando os passos para concretizar um dos seus sonhos. Em 2007 participou num desfile no Campo Sueco e ganhou o 1º Prémio ao representar o seu Bairro, Bandim I (junto ao mercado do Caracol), e em 2008 participou numa passagem de modelos na Lenox.

No dia-a-dia estas duas mulheres da casa, por mais de metade do dia em que a mãe está a trabalhar, contam que ajudam nas tarefas da casa. Levantam-se às 6 horas da manhã, vão apanhar água se for necessário, limpam a casa antes de sair. Vão para a escola a pé e têm a sorte de ser perto. Esta classe tem aulas de manhã mas no próximo ano a 10º classe será de tarde. Num dia cozinha uma e noutro dia a outra, e a que não cozinha arruma a loiça a seguir.
E os irmãos? Dizem que os rapazes também ajudam às vezes, o mais velho menos.
À tarde resta-lhes algum tempo para descansar, estudar, brincar.
Ao fim-de-semana gostam de ir à matiné da discoteca Sonhos.

Já começa a ser mais comum entre as jovens guineenses casarem e terem filhos mais tarde, mas ainda não é a maioria. Estas duas raparigas parecem-me mais meninas do que mulheres quando olho à volta e muitas das raparigas das suas idades têm já uma rotina diferente. Não é isso que querem para já. Têm outros objectivos. A sua formação já foi adiada tempo demais. Querem acabar os estudos, querem um curso de informática, querem ter esperança de que as suas vidas podem ser diferentes de tantas outras.

Quando lhes perguntei se pudessem escolher uma qualquer prenda que alguém lhes mandasse de Portugal não hesitaram: um computador portátil. Olham para o meu como se fosse a coisa mais fantástica que alguma vez viram. Explico-lhes o que é o messenger e que estou a falar em tempo real com uma amiga que está em Portugal. Primeiro a dúvida, depois o fascínio. É mesmo.

Quando lhes peço para serem mais contidas a pedir, a Menô pede roupa e livros, em especial um livro sobre etnias da Guiné-Bissau, e a Ondinha um MP3 e revistas de modelos. Concretizável. Fossem os seus sonhos também assim.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

TÁXI

No primeiro ano andei muitas vezes de táxi em Bissau. Depois cada vez menos até quase nunca. A semana passada apanhei um táxi na Avenida em direcção ao centro. Já nem me lembrava da última vez que tinha andado de táxi.
Mas lembrava-me, claro, que os táxis em Bissau são colectivos. Este vinha vazio quando entrei mas, à medida que avançava na Avenida, o taxista ia circulando mais perto do passeio na esperança de apanhar mais um cliente com destino no mesmo sentido.
Quando nos aproximávamos do destino já achava que desta vez não iria partilhar o táxi com mais ninguém, e então comentei com o Sene (taxista): Hoje não há muita gente a andar de táxi.
Diz o Sene: Esses tempos é assim. É a crise. Pessoas não andam mais de táxi. De facto olhei com mais atenção, e parece haver mais pessoas a pé e os táxis circulam cada vez mais com um só cliente.
Tive pena do Sene e de todos os outros. Aqui, os transportes públicos têm sido dos pequenos negócios mais rentáveis e acessíveis a vários guineenses (noutros negócios predominam internacionais).
Na Guiné tem-se ouvido falar menos de crise do que comparado com o resto do mundo. Se contacto diária e repetidamente com a palavra crise tal deve-se às notícias que vejo na RTP ou leio na internet. Talvez por na Guiné a situação ser permanentemente mais difícil que na maioria dos outros países (na última contagem era o 3º mais pobre do mundo) fala-se menos na palavra crise.
Agora torna-se assustador a constatação de episódios como este. Quando se pensa que aqui tudo está tão mau e que já não pode piorar. Pode sempre.
Nos dias que se seguiram voltei a andar de táxi, uma ou outra vez foi partilhado, outras não.
Uma viagem de táxi pela cidade custa, para a maior parte dos percursos, 300 Francos CFA (cerca de 0,45€).
Os táxis são na sua maior parte Mercedes velhos que vieram da Europa e alguns encontram-se em mau estado e aqui acabam de se deteriorar até não conseguirem circular mais.